quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

Mito: Damon & Pythias

"O que é um amigo? Uma alma habitando dois corpos". (Aristóteles)

Sempre que se fala de bons amigos, fidelidade e companheirismo, logo me vem à mente a história de Damon e Pítias, personagens da mitologia grega e símbolo do que lhes quero contar. Na mitologia grega, simbolizam a confiança e a lealdade de uma verdadeira amizade. 


Tudo acontece em um lugarejo chamado Siracusa, na Sicília, no século IV a.C..
Damon e Pítias eram muito amigos e viviam sempre juntos em todas as atividades do dia. Eram extremamente fiéis a esta amizade. Andavam pelos arredores da cidade, trocando ideias, como jovens pensadores que eram.
Pítias era o mais revolucionário dos dois. Alguém que possuía ideias avançadas e bem diferentes da época em que vivia. Um dia, em um de seus discursos de pensador, saiu pregando que nenhum homem devia ter poder ilimitado sobre o outro e que os tiranos absolutos eram reis injustos. Pronto! Bastaram tais palavras proferidas publicamente para que os poderosos se sentissem ameaçados pelo poder da inteligência daqueles amigos. E o que este fizeram para calar Pítias? Isso mesmo: mandaram prender o corpo dele e calar a sua voz. Assim, nada poderia ameaçar o poderio daqueles que mantinham o povo na escravidão dos corpos e das mentes.
Naquela época, quem estava no poder era Dionísio. Para que este rei garantisse o sua ditadura, aprisionou Pítias e também Damon. Mesmo preso e ameaçado de morte, diante das autoridades, Pítias confirmou suas ideias a respeito do poder e da liberdade. Pouco se importou em perder sua vida defendendo seus ideais de justiça social. Bastou tal declaração para que realmente fosse condenado à morte.
O rei Dionísio e outras autoridades condenaram nosso herói por traição. Antes de executá-lo, no entanto, o rei permitiu que Pítia fizesse seu último pedido. O jovem lhe pediu para sair da cidade e se despedir dos filhos e da mulher e colocar os assuntos domésticos em ordem. Como o condenado vivia deveria sair de Siracusa, o rei considerou um afronto tal pedido.
─ Quem pensa que eu sou? Um tolo? Se saíres da cidade para se despedir de sua família, jamais voltarás. Não... Não... Isso nunca!
Neste momento, Damon adiantou-se e deu-se por garantia:
─ Deixo-o ir. Ficarei em seu lugar até que ele volte e tenho certeza de que meu grande e fiel amigo voltará.
O rei, ainda incrédulo e desconfiado, analisou a situação e acabou por aceitar a proposta, impondo uma condição:
─ Pítias poderá sair de Siracusa, mas, se ele não voltar, você, Damon, morrerá no lugar dele!─ e, voltando-se novamente ao condenado, ─Agora, vá, resolva sua situação e volte. Lembre-se de que seu amigo é a garantia que tenho. Se não voltares, ele morrerá em seu lugar. Quero ver o tamanho desta amizade!
Após a libertação de Pítias para que ele resolvesse seus problemas junto à família, muitos dias já tinham passado. Todos imaginavam que Pítias aproveitara-se da boa vontade do rei e da fidelidade de Damon para fugir e se esconder das autoridades. Porém, isso não era verdade. Pítias estava passando por vários problemas que o impediam de chegar, mas disso ninguém mais sabia. Somente o coração de Damon, seu fiel amigo, que acreditava no retorno de Pítias.
O rei, quando se aproximou do dia da condenação, foi até o calabouço para examinar o ânimo de Demon ao ser abandonado pelo amigo naquelas condições. Em tom zombateiro, ao ver o prisioneiro jogado num canto da cela, perguntou:
─ Ainda tens esperança de que seu “fiel” amiguinho retorará? Ah! Ah! Ah! Somente um homem ingênuo como você acreditaria nisso. Poucas são as horas que te restam e nada farei para salvar a tua vida sem importância. És um tolo! O que pensas do seu amigo agora?
─ Ele não me faltará! Confio nele!
O rei Dionísio estava saindo daquele lugar horrendo, seguido pelos guardas e deixando para trás uma sonora risada de quem nem ouvira as palavras do prisioneiro.
Demon conhecia o amigo. Sabia de Pítias: dos propósitos, dos valores, do caráter, da personalidade e, principalmente, no que eles dois acreditavam sobre a amizade que tinham um pelo outro. Sabia que Pítias era seu fiel amigo e que jamais romperia um pacto tão sério quanto o que tinham desde muitos anos. A morte e o medo não seriam motivos para que aquela amizade terminasse simplesmente, como as areias que fogem com a ventania dos seus montes, procurando sempre outras paisagens onde se refugiar.
No dia em que a condenação iria se realizar, Pítias chegou num repente, ainda sujo, cansado, pálido, esbaforido da batalha do caminho.
─ Ainda bem que estás vivo! Cheguei a tempo para ser eu o executado! Parece que tudo conspirava contra nós, pois tive muitos contratempos até chegar aqui. O navio naufragou e bandidos me atacaram pelo caminho! Não perdi a esperança! Consegui chegar e estou pronto para cumprir minha sentença de morte.
Todos os que estavam presente se surpreenderam ao ouvirem tais palavras. O rei admirou-se com o poder da lealdade entre aqueles dois.
Ao presenciar essa cena, Dionísio foi vencido pela beleza daquele sentimento grandioso que se manifestava de forma comovente diante dos olhos dos presentes. Imediatamente, o rei declarou revogada a sentença, admitindo ter cometido um erro. Era a primeira vez que presenciava evidências de tão elevado grau de amizade, lealdade e fé. Assim, o rei de Siracusa concedeu-lhes a liberdade, solicitando em troca que os dois amigos lhe ensinassem como construir tão sólida amizade.
─ A sentença está revogada! Jamais acreditei que pudessem existir tamanha fé e lealdade na amizade. Vocês mostraram como eu estava errado. É justo que ganhem a liberdade. Em troca, porém, peço um grande auxílio.
─ Que auxílio? ─ Perguntaram os amigos.
─ Ensinem-me como consolidar tão grandiosa amizade.

Autora: Luciane Mari Deschamps

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