terça-feira, 22 de março de 2016

The Lady of Shalott



Parte I 

Em cada margem do rio estendem-se 
Longos campos de cevada e de centeio 
Que vestem o mundo e confrontam o céu 
E pelos campos corre uma estrada 
Até às muitas torres de Camelot; 
E as pessoas passam a subir e descer 
Apreciando os lírios a florescer 
Em torno de uma ilha ali em baixo 
A Ilha de Shalott. 

Os salgueiros alvejam, os álamos ondulam 
Suaves brisas turvam e tremem 
Por sobre a torrente que corre para sempre 
Junto à ilha no meio do rio 
Fluindo até Camelot. 
Quatro muros pardos e quatro torres pardas 
Debruçam-se sobre um espaço de flores 
E a ilha silenciosa alberga sob as árvores 
A Senhora de Shalott.

Junto à margem, velada de salgueiros
Deslizam as pesadas barcaças puxadas 
Por cavalos lentos, e sozinha 
Desliza a escuna com velas de seda 
Sem escuma até Camelot 
Mas quem a viu acenar com a mão? 
Ou ao parapeito a viu arvorar? 
Será ela conhecida por toda a terra 
A Senhora de Shalott? 

Só os segadores ceifando cedo 
Por entre as espigas da cevada 
Ouvem uma canção que ecoa alegre 
Claramente soprada do rio 
Até às torres de Camelot 
E sob a lua o ceifeiro cansado 
Empilhando feixes em regos arejados 
Escutando, murmura: «É a fada 
A Senhora de Shalott.» 

Parte II 

Ali ela tece de noite e de dia 
Uma teia mágica com cores alegres. 
Ela ouviu um murmúrio dizer 
Que uma maldição sobre si cairá 
Se olhar para Camelot 
Não sabe bem o que a maldição possa ser 
E por isso vai tecendo constante 
E nenhuns outros cuidados tem 
A Senhora de Shalott.

E movendo-se por um espelho claro
 Dependurado diante de si o ano todo 
Sombras do mundo lhe aparecem. 
Ali ela vê a estrada perto 
Serpenteando até Camelot: 
Ali o redemoinho do ribeiro rodopia 
E ali os rústicos aldeãos de caracóis
 E as capas vermelhas das vendedeiras 
Passam além de Shalott. 

Às vezes um bando de donzelas alegres 
Um abade caminhando lento 
Às vezes um pastorinho de caracóis 
Ou um pajem carmesim de longos cabelos 
Passam até às torres de Camelot 
E às vezes pelo espelho azul 
Vêm os cavaleiros, a dois e dois: 
Não tem cavaleiro leal e verdadeiro 
A Senhora de Shalott 

Mas na sua tapeçaria ainda se delicia 
A tecer as visões mágicas do espelho 
Pois muitas vezes nas noites caladas 
Um funeral, com plumas e luzes 
E música, entrou em Camelot 
Ou quando a lua se ergueu a pique 
Vieram dois jovens amantes recém casados 
«Estou meio farta das sombras» disse 
A Senhora de Shalott 

Parte III 

A um lance de seta do átrio da alcova, 
Cavalgou ele entre os feixes de cevada, 
O sol saiu brilhante por entre as folhas 
E flamejou sobre as luzentes grevas 
Do audaz Senhor Lancelot 
Um paladino de cruz vermelha ajoelhado 
Diante de uma dama para sempre no escudo 
Que reluzia no campo amarelo 
No flanco da remota Shalott 
A rédea com jóias cintilava livre, 
Como algum ramo de estrelas que vemos 
Dependurado da galáxia dourada. 
As sinetas da rédea cantavam alegremente 
Com ele a cavalgar até Camelot: 
E do cinto da espada brasonado
 Pendia uma poderosa corneta de prata 
E com o cavalgar o arnês tilintava 
No flanco da remota Shalott. 

Todo, sob o tempo azul sem nuvens
Brilhava denso de jóias o couro da sela. 
A viseira, e a pena do elmo 
Ardiam juntos como uma única chama, 
Com ele a cavalgar até Camelot. 
Como tantas vezes na noite púrpura 
Sob os cachos de estrelas brilhantes,
 Algum meteoro de cauda, rasteando luz 
Move-se sobre a calma Shalott 

A testa larga e clara brilhava-lhe à luz do sol. 
Com cascos polidos trotava o corcel de guerra. 
De sob o seu elmo flutuavam-lhe 
Os caracóis de azeviche, com ele a cavalgar, 
A cavalgar até Camelot. 
Da margem e do ribeiro 
Ele faiscou no espelho de cristal 
«Tira lira», junto ao rio, 
Cantava o Senhor Lancelot. 

Ela abandonou a teia, abandonou o tear: 
Deu três passos a cruzar a sala 
E viu os rebentos dos nenúfares: 
Ela viu o elmo e a pluma 
Ela olhou para Camelot. 
Para longe voou a teia, e flutuou esparsa; 
O espelho partiu-se de lado a lado 
«A maldição caiu sobre mim» gritou 
A Senhora de Shalott 

Parte IV 

Lutando contra o tempestuoso vento leste 
Os bosques amarelo-pálido desvaneciam-se 
O largo ribeiro a lamentar-se nas margens, 
Pesadamente o céu baixo começou a chover 
Sobre as torres de Camelot 
Ela desceu e descobriu um barco 
Abandonado a flutuar sob um salgueiro 
E em torno da proa escreveu 
A Senhora de Shalott. 

E pela extensão baça do ribeiro 
Como algum ousado vidente num transe 
Vendo toda a sua própria desgraça – 
Com compostura de vidro 
Olhou ela para Camelot 
E chegando o fim do dia 
Soltou a amarra e deitou-se nele 
O ribeiro largo levou-a para muito longe 
A Senhora de Shalott. 

Deitada, um vestido branco de neve 
Ondeava solto para a direita e a esquerda 
Sobre si caindo leves as folhas 
Por entre os ruídos da noite 
Flutuou ela até Camelot 
E a proa do barco ao cortar ao longo 
Dos montes de salgueiros e por entre os campos 
Ouviram-na cantar a sua última canção 
A Senhora de Shalott. 

Ouviram um cântico, funesto, sagrado 
Cantado alto, cantado lentamente 
Até que o sangue se lhe gelou lentamente 
E os olhos de todo se lhe escureciam 
Se viraram para as torres de Camelot 
Pois até alcançar com a maré 
A primeira casa junto à margem 
Cantando a sua canção, ela morreu 
A Senhora de Shalott. 

Sob as torres e as sacadas 
Junto aos muros dos jardins e galerias 
Uma forma brilhante, ela flutuava, 
Pálida de morte, entre as casa no alto 
Em silêncio até Camelot. 
Até ao embarcadouro eles vieram 
Cavaleiros e burgueses, senhores e damas, 
E em volta da proa o nome lhe leram 
A Senhora de Shalott. 

Quem aqui vai? O que está aqui? 
E no palácio iluminado ali perto 
Morreu o som dos clamores reais 
E benzeram-se com medo 
Todos os cavaleiros em Camelot: 
Mas Lancelot ficou a pensar um pouco 
E disse: «Tem uma face formosa 
Deus na sua misericórdia deu-lhe graça 
À Senhora de Shalott.»

(Alfred Lord Tennyson)
(Tradução: Helena Barbas, 2006)

Um comentário:

  1. Adoro Loreena McKennitt, sua voz é belíssima! Ainda não havia escutado essa música, gostei bastante. A letra é um poema muito inspirador, remete-nos a uma bela história épica passada em tempos longínquos..

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